Acredito que todos vocês já devem estar sabendo da empreitada do ECAD nesses últimos dias e agora é hora de nos mobilizarmos para nos opor a essa sandice que vem sendo compactuada inclusive por nossa ministra da cultura, mas rejeitada pela web em peso e também por diversos artistas do cacife do Leoni, por exemplo.
Logo que fiquei sabendo da notícia pensei em escrever sobre o assunto, mas lembrei-me do grande amigo twitterário Felipe Tebet que escreve no blog que leva seu nome e é alguém muito mais gabaritado para abordar o assunto do que eu, por ele ser um exímio conhecedor de música, usuário ativo na internet e possuir conhecimentos profundos sobre legislação.
Não vou prolongar esse prefácio e vou deixá-los com este excelente "guest-post" preparado pelo Felipe.
Boa leitura e disseminem o texto à vontade pela rede, nós não iremos cobrar direitos autorais. Só lembrem-se de citar a fonte e o autor ;)
@alvarodiogo "Apenas compartilhe!"
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O Ecad, a cobrança sobre blogs e a necessidade de uma discussão mais ampla
Por Felipe Tebet*
Assunto de ontem na internet foi o
ECAD e a sua iniciativa de cobrar de blogs valores inerentes a direitos
autorais por vídeos do YouTube incorporados em suas páginas.
"Quais os interesses por trás do ECAD?" via Bodocongó |
A história toda teve início na
terça-feira da semana passada, dia 28 de fevereiro, quando o pessoal do blog Caligraffiti recebeu,
via e-mail, um aviso do ECAD de que teriam de pagar R$ 352,59 mensais pelo
conteúdo dos vídeos postados no blog (leia
aqui).
Cientes de que o ECAD tem um
acordo com o YouTube e por força deste acordo o YouTube já paga um valor mensal
ao órgão arrecadador pela publicação dos vídeos (entendida como execução
pública dentro dos parâmetros da Lei 9.610/98,
nossa lei de direito autoral), inconformados, os autores do blog questionaram a
cobrança, acendendo um debate fervoroso na web.
O ECAD
justifica a cobrança no Art. 5º, inciso II da Lei de Direito
Autoral e afirma que existem diversas modalidades de
utilização das obras e que são independentes entre si “e a autorização para o uso por uma delas
não se estende para as demais”, e completa com a pérola: “Isto significa que, se uma rede social
como o YouTube, por exemplo, efetua o pagamento do direito autoral pela
execução pública musical dos vídeos que veicula, o uso destes por terceiros
caracteriza uma nova utilização, cabendo, portanto uma nova autorização/licença
e um novo pagamento”.
"Ecad é condenado por cobrar direitos autorais em casamento" via Eco e Antigos |
O problema aqui é que, na realidade,
não se trata de uma nova utilização. O “embedamento” (ou incorporação) de
vídeos em sites não se enquadra em nenhuma das modalidades de execução pública
em mídias digitais mencionadas pelo ECAD em sua
justificativa:
“Mídias Digitais: Streaming (permite que um conteúdo seja transmitido
na rede. As informações transmitidas não são arquivadas na máquina do usuário), Simulcasting (transmissão simultânea de rádio e TV
convencionais para dispositivos conectados à rede), Ambientação de sites (sonorização de sites com músicas)”
Obviamente não se trata de
Simulcasting e muito menos de Ambientação de Sites. Talvez à primeira vista
possa parecer tratar-se de Streaming. Contudo, quem de fato faz o streaming, ou
seja, a transmissão, é o próprio YouTube. Quando um usuário, através do blog,
clica em “play”, o arquivo roda diretamente dos servidores do YouTube, é ele
quem faz a transmissão.
É um conceito muito fácil de se
compreender (com um pouco de boa vontade, o que parece faltar ao ECAD). Vídeos
‘embeded’ (incorporados) não podem ser caracterizados como transmissão, pois no
próprio código da postagem do blog, se encontra o código da página do YouTube.
Tecnicamente, é uma janela para o YouTube, um atalho, e não uma retransmissão.
É o conceito técnico de ‘inframe’ (abrir uma página dentro de outra).
Por esta simples razão é que a
oportunista cobrança do ECAD é tão absurda e gerou tanta repercussão. Está
havendo uma cobrança dobrada. Estão cobrando por algo que já está sendo pago.
Isso sem adentrar na questão da ausência da finalidade lucrativa, o que, para
o STJ, também seria necessário estar configurada, além da
execução pública, para tornar legítima a cobrança, o que não se verifica
no caso do blog em
comento.
As políticas de arrecadação do
ECAD sempre tiveram alguns absurdos pouco questionados por aí. Um exemplo disso
é o fato de que todo hotel tem de pagar ao ECAD R$ 21,00 por cada quarto que
dispõe de aparelho de rádio, a título de direitos autorais (dados
de 2011). A questão é que não há como saber qual estação o
hospede ouvia, se escutou somente notícias ou de fato ouviu musicas, e se
ouviu, quais músicas tocaram, ou ainda, se o hospede chegou a ligar o
rádio ou não. Para quem vai esse dinheiro arrecadado? Quais artistas têm
direito a ele? Entendem?
O mesmo funciona para lojas,
bares, restaurantes, consultórios, com critérios diferentes. Nestes
casos, assim como no dos blogs, há uma dupla cobrança pela mesma execução de
obra, já que as emissoras de rádio, as que de fato transmitem a programação, já
fazem pagamento ao ECAD dos direitos autorais para que possam transmitir. Os
hotéis, lojas e consultórios citados como exemplo apenas oferecem um meio para
que as pessoas tenham acesso à programação por ela transmitidas.
"ECAD: entenda essa patifaria" via Blog do Vegetal |
Trata-se mais uma vez do
oportunismo e da sede por dinheiro dos membros do ECAD que, por não sofrer
fiscalização nenhuma de qualquer órgão ou entidade, “às vezes atua como batedor
de carteira, onde tiver dinheiro vai buscar um pouco mais”, como critica o
músico Leoni (ex-baixista do Kid Abelha) em reportagem
d’O Globo.
Na realidade, talvez nem fosse tão
grande a discussão acerca das (contestáveis) formas de arrecadação de direitos
autorais pelo ECAD se houvesse por parte do mesmo uma transparência quanto à
política de distribuição desses valores, o que não ocorre. Muitos dos artistas
não vêem um centavo do valor arrecadado e muitos outros recebem valores
ínfimos, enquanto
outros (falsários) recebem vultuosas quantias por obras alheias.
No fim das contas, o grande vilão
da história toda acaba sendo o próprio ECAD, que arrecada, mas não distribui. É
único que de fato lucra com a criação artística alheia. Então, estamos a
proteger os direitos dos artistas ou os interesses do órgão arrecadador?
É claro que os direitos autorais
precisam ser protegidos e resguardados, afinal, esse é o ganha-pão das pessoas
que trabalham nesse meio, pessoas vivem disso. A questão é que temos uma
legislação completamente defasada e obsoleta acerca do assunto diante do
contexto de mídias digitais que vivemos hoje, somada a uma ‘indústria cultural’
estagnada num modelo de controle e monopólio da produção e distribuição de
mídias que não tem o menor interesse em discutir uma nova forma de arrecadação
e distribuição dos direitos autorais através de um legislação decente e novas
políticas de proteção dos direitos autorais no ambiente digital.
Ao invés disso, correm na direção
contrária, o ECAD e as gravadoras buscam manter o seu engessado modelo que
sempre lhe renderam muito dinheiro (e pouca dor de cabeça).
Os tempos mudaram, as formas de
produção, divulgação e distribuição das mídias também. As leis, as gravadoras,
o ECAD e todo o setor da ‘indústria cultural’ que lucra (ou lucrava) muito com
isso não se dispuseram a acompanhar a evolução, e agora estão aí, tentando
impedir que ela aconteça.
O que precisamos (e não é de hoje)
é intensificar o já amplo debate acerca de uma
nova legislação para proteção dos direitos autorais que
seja condizente com a realidade do contexto virtual/digital e do modelo de
compartilhamento que temos hoje. Não se pode parar ou impedir a internet, e a
essência da internet é o compartilhamento.
Não que seja um modelo perfeito,
mas a Apple conseguiu, com a iTunes Store, grande sucesso através de um modelo
equilibrado e efetivo de venda de músicas online no contexto virtual, cobrando
um valor justo e remunerando devidamente os artistas. Hoje a maior loja de
música online da web.
Esperamos que essa repercussão
toda vá além da questão da legalidade/legitimidade da cobrança do ECAD sobre os
blogs que incorporam vídeos em seus posts, mas que de fato sirva para despertar
a sociedade para a urgente necessidade de discussão de novas leis no nosso
ordenamento jurídico que alcancem situações do contexto digital de forma mais
objetiva, não só no campo dos direitos autorais, mas de todas as demais
relações no âmbito da sociedade civil (com a discussão também do Marco Civil da Internet)
Links complementares:
ECAD
é condenado por cobrar direitos autorais em casamento (a questão da
não finalidade lucrativa) / Acórdão
do STJ sobre o assunto
Rapper
Emicida conta que foi cobrado por improvisações (“...tem que ver isso
aí, porque vocês vão usar palavras que já existem...”)
Um comentário:
Olá! Passei para conhecer e adorei! Venha me visitar! Sala de Aula
reridamaria.blogspot.com
bjs...
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