--- Frase de Agora! ---
"A água é para os escolhidos
Mas como podemos esperar que sejamos nós..
... eu e você?"

Máquina do Tempo: Vaga Viva do Coletivo Ideia Nossa. A única vaga viva do lado de cá da ponte =) Vaga Viva do Ideia Nossa

Destaque da Semana: Onde está o sol que estava aqui?
Ladrões de sol, crise hídrica e êxodo rural

terça-feira, 30 de abril de 2013

Um esforço coletivo contra as desigualdades

Por Natália Burkle

Levei um tempo para absorver todas as coisas que senti sendo chefe de escola pela primeira vez, agora na DM¹ de março. O peso da responsabilidade, por incrível que pareça, se tornou maior depois que a DM acabou. Mas esse “peso” não se deve ao cargo que eu assumi durante a DM, porque isso já não importa, mas às minhas constatações ao final dela.

Primeiro, reparei no quanto estava cansada, mas em como estava fe
liz por tudo ter dado certo. E então, como se eu pudesse ouvir a minha própria voz dentro da minha cabeça, eu pensei: “acabou”.

Mas esse “acabou”, talvez tenha sido uma das maiores mentiras que eu já contei para mim mesma, e logo, me dei conta disso.


Lembrei das famílias. Do líder comunitário. Das crianças. De uma senhora cuja enquete eu acompanhei... Pensei em todas as histórias que já ouvi no TETO. Em todas as mães que conheci. Em todas as crianças que peguei no colo. Nas pessoas que são tratadas por toda uma sociedade opressora como se não existissem. Pessoas que são tratadas como se fossem mais do que invisíveis. Porque até o que é invisível...como o vento, todos podem sentir. E essas pessoas...quase ninguém vê, muito menos sente.

Eu amo o trabalho que a gente pode fazer através do TETO. Mas o que eu mais queria no mundo, era que o nosso trabalho não precisasse existir. O que eu mais queria no mundo, era não ter que me questionar por que que uma criança vive descalça na favela, com a roupa furada, passando frio, e sem nenhum brinquedo, enquanto eu sempre tive tudo. Por que que senhoras de oitenta e poucos anos, viúvas e sem o amparo de ninguém, precisam se endividar com empréstimos para comprar um barraco na favela, que pode desabar a qualquer momento, e por um pedaço de terra do qual podem ser retiradas do dia pra noite, sem mais nem menos, enquanto eu sempre tive um teto seguro sobre a minha cabeça. Por que que mães chegam ao ponto de pensar em suicídio e em matar seus próprios filhos com comida envenenada, pra não vê-los morrendo de fome aos poucos, se na minha casa sempre teve fartura de comida.

E por que que tem que ser assim? Pois é. Não tem. Não deve.

E esse final de semana, eu vi um grupo de jovens se questionando sobre as mesmas coisas. Muitos dos quais estavam entrando em uma comunidade pela primeira vez. E pude ver nos olhos deles e nas vozes engasgadas, que além de ver essas pessoas, eles também foram capazes de senti-las.

Esses jovens perceberam que a nossa realidade, e a realidade das pessoas que vivem nas comunidades, é a mesma, porque todos nós vivemos em um mesmo mundo. Um mundo que é sim, cruel, desigual e perverso.

Só que esse mundo só é assim porque foi construído desse jeito. E hoje, sou alguém mais confiante, porque vi o desejo de mudança, tanto nas famílias que vivem nas comunidades, quanto nesses jovens. E pensando na força que eu enxergo nessas pessoas, vejo um objetivo em comum: o fim da pobreza. Uma pobreza que vai muito além de somente a renda.

Vejo também o fim da pobreza intelectual, moral e espiritual.

A partir de hoje, o que vai me mover, não é mais a indignação de viver numa sociedade desigual. Mas é a certeza de que através do esforço coletivo, nós viveremos um dia em um mundo no qual as pessoas serão SIM tratadas como iguais. Um mundo no qual todos terão as oportunidades que eu tive. Um mundo assim pode parecer impossível. Mas como disse Nelson Mandela: “tudo parece impossível, até que seja feito”.

Sabemos que esse futuro ainda está longe. Sabemos que o trabalho não está nem perto de acabar. Mas aceitamos essa responsabilidade, com a certeza de que não estamos mais sozinhos.

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¹ DM: Detecção Massiva, etapa anterior a construção, quando os voluntários vão até comunidades passíveis de receber a construção e aplicam enquetes com as famílias para coletar dados socioeconômicos e averiguam a situação dos barracos, para então, eleger com base nas enquetes respondidas, quais famílias receberão a construção.

sábado, 20 de abril de 2013

Olho por olho e todos ficaremos cegos

Por Rodrigo Martins

Após o assassinato do jovem de 19 anos na porta de seu condomínio por causa de um celular, mais uma vez o debate sobre a redução da maioridade penal está nos noticiários e na opinião pública. O
Brasil ficou indignado e desta vez (aparentemente) está decidido a reduzir a maioridade penal para 16 anos.

O brutal assassinato é realmente revoltante. As cenas, do tiro fatal que levou à morte o garoto estudioso e de futuro promissor de 19 anos, que foram exploradas incansavelmente pela mídia e redes sociais leva qualquer pessoa em primeiro momento a querer pena de morte para o assassino.

O assassinato deste garoto e tantos outros, em especial os da periferia que não chegam aos noticiários, são o mais puro reflexo de uma sociedade que valoriza o ter: “quanto mais eu tenho, mais eu sou”. 

O celular (pivô da tragédia) é apenas o símbolo de um falso sucesso, onde quem tem e pode ostentar é bom, é o “cara” tão falado e explorado positivamente em especial por novelas que entoam: "esse cara sou eu".

Quando discutimos a redução da maioridade penal precisamos colocar alguns pontos de destaque, entre eles, a nossa cultura. Afinal a cultura é o funk que em suas letras musicais diz: “Ostentação fora do normal, quem tem motor faz amor e quem não tem passa mal”. Não somente isso, mas em especial a falta de uma educação de questionamentos, inclusive moral. Nas escolas não se destaca ou se estuda a história de uma sociedade construída da luta em prol do ser. 

A falta de um estudo de sociologia, a falta de uma educação onde ensine a interpretar um texto, a falta de um respeito mútuo, a falta de respeitar o espaço do outro. A falta de uma simples lição: “Este apontador não é seu, minha filha”. Valores culturais e respeitosos que estão sendo perdidos com o tempo.

Quando lembramos os momentos decisivos do nosso país, em que muitos morreram defendendo a liberdade de expressão, entendia-se que “SER” era superior ao “TER”, ou seja, lutava-se para ser um estudante que pudesse questionar o sistema, lutava-se para ser um profissional que pudesse contribuir com uma sociedade mais justa e igualitária. 

Infelizmente, pautados pela mídia, estamos em construção de uma sociedade em que na novela das nove, discute-se quantas mulheres o “Théo” pode ter, para ainda assim ser o cara perfeito para você.

E o que isso, tem a ver com o atual debate? É simples, quanto menos eu sei, mais fácil eu aceitarei.

Não se discute o sistema prisional que está falido, não se discuti o sistema da Fundação CASA (antiga FEBEM) que não reeduca ninguém, que não socializa ninguém e não recupera os 'perdidos'.

Não defendo bandido, muito menos assassino. Mas não podemos acreditar que aquele gatilho foi puxado sozinho. TODOS temos parte neste crime, quando criamos uma sociedade de olho por olho, obviamente, alguém vai ficar cego.

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Dica de leitura: Razões para NÃO diminuir a maioridade penal
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